Viagens e impressões do Brasil
Viagens e impressões do Brasil no olhar do
Conde D’Aurora
Porto, Liv. Simões Lopes, 1955, p. 21-22
Disso são prova eloquente as suas viagens e contactos, bem como as inúmeras visitas da sua Casa de Nossa Senhora da Aurora, em Ponte de Lima. Como generoso anfitrião, recebeu ilustres figuras de intelectuais, escritores e artistas, como Luís Forjaz Trigueiros, Pedro Homem de Mello, Sebastião da Gama, Sophia de Mello Breyner, Ruben A., Margot Fontaine, entre outros.
Uma dessas visitas, em 1951, foi o escritor e antropólogo brasileiro Gilberto Freyre, o autor de Casa Grande & Senzala, então em Portugal a convite do governo de Oliveira Salazar. Aliás, outros nomes relevantes da cultura brasileira foram recebidos pelo Conde d’Aurora na sua casa de Ponte de Lima: o poeta Jorge de Lima, o filólogo Aurélio Buarque de Holanda, o escritor Alceu Araújo Lima (Tristão de Athayde) ou o historiador Luís da Câmara Cascudo. A todos José de Sá Coutinho proporcionava um banho cultural nas tradições limianas e minhotas do Norte de Portugal, reforçando dessa forte ligação fraterna com o Brasil. Destaquemos algumas passagens mais representativas dessa viagem cultural e suas correspondentes impressões, como a da chegada, a 6 de Agosto de 1954.
Ainda durante a escala no Recife, o autor soube do atentado contra o amigo Carlos Lacerda. De facto, uma das obras mais singulares do 3º Conde d’Aurora é um curioso livro de viagens, intitulado Brasil, Ida e Volta – Porto, Liv. Simões Lopes, 1955, 109 págs., ilustrado com 40 fotografias do próprio, algumas das quais reproduzimos aqui. Essa pequena obra tem a particularidade de nos descrever a viagem efectuada pelo autor ao Brasil no mês de Agosto de 1954.
Com efeito, trabalhando no Porto como magistrado, José de Sá Coutinho é convidado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros para, como escritor e homem de cultura, integrar uma missão de representação de Portugal no Congresso de Escritores de São Paulo – anfiteatro da Biblioteca Pública Municipal de São Paulo –, cidade já então com três milhões de habitantes. Congresso presidido por Paulo Duarte, tendo como vice-presidente Lygia Fagundes.
Nessa missão cultural, esteve acompanhado dos professores Costa Pimpão e Rodrigues Lapa; além dos escritores Miguel Torga (com a esposa, Crabbé Rocha) e Casais Monteiro; à última hora, faltou Hernâni Cidade. Ora, é desde logo notável a forma como este homem conservador se relaciona com todos, portugueses ou de outras nacionalidades, defendendo sempre os interesses e a imagem de Portugal, com frontalidade e convicção. Aliás, em matéria de política brasileira, o autor testemunha um momento de certa agitação social, com destaque para o suicídio do presidente Getúlio Vargas. Compreensivelmente, um dos aspectos que mais fascina o viajante português é especialmente a rica e variada paisagem carioca.
Medito sobre estas construções de Santa Teresa, tão bem enquadradas na paisagem local, tão cheias de beleza e de harmonia, com aquele equilíbrio estético que os pintores ingleses denominam balance (…). / Jardins cuidados ao máximo, ao ponto de o Rio ter o melhor jardinista do Brasil: Roberto Burle-Marx.
Lindíssimas árvores: o cipó com vastas raízes aérias, caindo do alto como cordame de navio; a jáca e seu fruto agarrado ao tronco (…); a linda mimosa ou quaresma, roxa e amarela; a chorona, folha rendilhada e fina em vez da vergasta do nosso chorão; a mangueira tão folhuda e umbrosa, de sombra espessa; a murteira, de enorme folha recortada e longa; a amendoeira também de larga folha, como aquela gigantesca, humanamente grande apenas, perdão, a do Largo da França.
Os “apontamentos de viagem” por terras brasileiras mostram-se contagiantes pelo registo adoptado, por um lado; e por outro, pela capacidade descritiva dos lugares e das figuras com quem o ilustre viajante limiano se vai cruzando. Ou seja, vemos impressões de um certo Brasil, a partir do olhar de um homem superiormente culto e bem relacionado.
Entre outros aspectos, revela-se muito interessante ver quem eram os autores mais consagrados ou populares no Brasil por esta altura, avultando figuras como Júlio Dantas. Não deixa de ser curiosa a breve troca de palavras com Torga, por ex., a par das impressões que nos vai apresentando de vários escritores e intelectuais de relevo: Lígia Fagundes Teles, Oswaldo de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Almeida Prado, Afrânio Coutinho, António Soares Amora, Wilson Martins, etc.
(reprodução foto publicada no livro)
Em São Paulo, aterrando no aeroporto de Congonhas, fica hospedado no Hotel Comodoro – “todo o conforto – mas a penitenciária elegante do isolamento: só, em São Paulo. Que fazer?” As impressões paulistanas não são em geral muito positivas, desde a nova arquitectura até ao ritmo da cidade:
(reprodução foto publicada no livro)
“Cidade nova – de bicheiros em grande, de jogo casineiro e clandestino”. Na cidade de Belo Horizonte, o viajante demorar-se-á na admiração de vários aspectos da cidade da Pampulha – a singularidade da paisagem, as enormes avenidas, a conjugação do antigo e do moderno, com destaque para a moderna igreja de Niemeyer, com participação de Portinari:
(reprodução fotos publicadas no livro)
(reprodução foto publicada no livro)
(reprodução foto publicada no livro)
(reprodução foto publicada no livro)